quinta-feira, 2 de julho de 2015

A Ditadura da Amamentação e o sentimento de culpa

Tem sido comum ouvir comentários do tipo: "é mais mãe porque amamentou", "não é uma boa mãe porque ofereceu leite artificial", "não ama tanto o filho, senão teria insistido mais, suportado todos os problemas", "tenho vergonha de dizer que não consegui amamentar", "as pessoas me olham de cara feia quando dou mamadeira pro meu bebê".
Amamentar ao seio é importante? Sim!
O leite materno é superior a qualquer fórmula artificial? Lógico, não tenho a menor dúvida!
Tá certo, mas e se a mãe não conseguir? Se por um acaso ela tiver uma fissura não tratada e, em seguida, virar uma mastite, a produção de leite materno diminuir, o bebê perder peso, o emocional ficar abalado e pronto, era uma vez a amamentação. O que devo fazer? Ou melhor, o que "devemos" fazer (sim, porque vc também é responsável)?
Posso afirmar que cobrar com certos olhares não será o caminho certo a ser percorrido.
Nesse momento a mãe está mais que fragilizada, ela se sente também incapaz. Ela pensa mais ou menos assim: "Minha vizinha está amamentando, minhas primas amamentaram, minha irmã amamentou e só eu que não consigo. O que tem de errado comigo? Eu queria tanto amamentar...".
Ela passa a se sentir menos mãe, menos mulher.
Volto a falar o que já mencionei em postagem anterior, como estão sendo feitas as consultas de pré-natal? A futura mamãe tem sido realmente orientada de como é a fase de amamentação? Pelos relatos que ouço, muitas informações só são recebidas após o parto, mais precisamente quando a "mamãe" está enfrentando o tal do problema.
Devemos apoiar o aleitamento materno exclusivo até os 6 meses e complementado até os 2 anos de idade ou mais (que lindo!)?Claro que devemos, pois sabemos de todos os benefícios dessa prática tanto para mãe e bebê, quanto para nossos indicadores de saúde infantil. Mas vamos ser realistas também, né? Ainda existem muitos mitos, falta informação, como também faltam serviços voltados para que a amamentação seja bem sucedida. Portanto, enquanto estas práticas não mudarem, começando por um pré-natal bem feito, muitas mulheres terão dificuldades e não resistirão a tanta dor (e não me refiro somente a física, imagina só o filho não conseguir se alimentar) e o desmame será inevitável.
Que tal amenizarmos a dor dessa mulher? Amamentar teria sido bom, mas se não foi possível, não vamos julgá-la!
Vamos entender o que sente/pensa essa mulher que queria amamentar e não conseguiu. A psicóloga do Banco de Leite Humano do Hospital Universitário Materno Infantil, Wênnya Araújo, explica que por vivermos em uma sociedade em que o aleitamento materno é recomendado como a melhor forma de alimentar o filho, a mulher que não consegue amamentar, desenvolve esse sentimento de culpa. "Se essa mulher tivesse inserida em outro contexto cultural, onde a amamentação não fosse padrão, esse sentimento de culpa não existiria", destaca. 
A psicóloga relata ainda que ao analisar o histórico dessa mulher, se ela foi amamentada, o sentimento de culpa prevalecerá ainda mais, uma vez que ela passa a ter uma a dívida simbólica com a criança, pois a primeira declaração de amor que a mãe faz para o bebê é a amamentação e ela não conseguiu.
Questionada sobre a possibilidade do sentimento de culpa ocasionar uma depressão, Dra. Wênnya Araújo alerta quanto a conduta a ser adotada. "A equipe de saúde nem sempre se preocupa em conhecer a realidade daquela mãe, os motivos pelos quais ela não conseguiu amamentar, isso já agrava os problemas dela. Antes de impor a amamentação, a equipe deve ter empatia, conhecer melhor essa história para conduzir adequadamente essa mãe".
Segundo a psicóloga, a família também tem um papel importante. "Como os familiares estão conduzindo essa situação? Se você percebeu que a mãe está apresentando um humor depressivo, que não é a mesma coisa que depressão, uma certa culpa em relação a dificuldade de amamentar, ela deve ser encaminhada para o acompanhamento psicológico".
Ainda de acordo com a profissional, é importante a mulher saber porque ela não conseguiu amamentar, o motivo pode estar no campo biológico e se não estiver, estará no psicológico, mas ela precisa saber. "A partir dessa conscientização podemos traçar um roteiro e conduzir melhor a situação, pois trata-se de uma vivência específica de cada mulher", concluiu.

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